No evento, diretor do
observatório astronômico de Maceió palestrou sobre a importância dessas
publicações para o desenvolvimento da ciência
Por Pedro Barros
“Olha pr’o céu meu amor, veja
como ele está lindo...”. Luiz Gonzaga não precisa nem pedir: para os
nordestinos que se reuniram este fim de semana, de 26 a 28 de maio, no Centro
de Educação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), observar a rotina
celeste faz parte do seu cotidiano. Cearenses, potiguares, paraibanos,
pernambucanos, alagoanos e sergipanos participaram do 16º Encontro de
Astronomia do Nordeste (Eane 2016), que contou com 8 palestras e 15
apresentações orais, além da exposição de pôsteres científicos, de astrônomos
profissionais e amadores.
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Delegação alagoana incluiu membros do Clam e Ceaal e representantes do Cecite |
A astronomia revelou sua
multidisciplinaridade na diversidade das palestras. Marcelo Zurita, da
Associação Paraibana de Astronomia (APA), por exemplo, explanou sobre o Encontro
Paraibano de Astrofotografia (EPA), o maior do Nordeste; já o químico João
Bosco Paraíso mostrou a pesquisa que tem realizado na UFPE que pode ajudar a
entender a formação de determinadas substâncias orgânicas no espaço; Sílvio
Garnés, do Departamento de Engenharia Cartográfica da UFPE, foi o convidado
para falar das coordenadas do céu, campo de estudo compreendido pela astrometria.
Os nordestinos também receberam
uma visita do Sul do país: Rio Grande do Norte pôde se encontrar com Rio Grande
do Sul graças à presença de Cristian Westphal, criador do site Ciência e
Astronomia. O jovem de 20 anos, que coordena um dos maiores canais de
divulgação científica brasileiros no YouTube – com mais de 76 mil inscritos –,
mediou, por videoconferência, uma das palestras mais aguardadas do evento: o físico
Paulo Leme, professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências
Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG/USP), explicou as etapas da
missão que conseguiu, pela primeira vez, pousar a sonda Philae no cometa 67P/Churyumov-Gerasimenko.
“Existem três categorias de missões espaciais: as difíceis (voo rasante), as
muito difíceis (entrar em órbita) e as ridiculamente difíceis (aterrissar em um
planeta). Aterrissar em um comenta é uma missão ‘quase impossível’”, brincou o
cientista.
Diversidade de temas
Os trabalhos submetidos seguiram
no mesmo caminho: as apresentações foram de educadores compartilhando suas
experiências no ensino de astronomia até astrônomos amadores mostrando os instrumentos
que montaram para estudos astronômicos. “Cultivando com as estrelas” foi o
título do trabalho de Jhonatan Carvalho de Souza, da Paraíba, que buscou
relacionar o conhecimento tradicional de agricultores com os conhecimentos
científicos da astronomia.
O monitoramento da passagem de
meteoros pelo céu nordestino foi um dos assuntos mais falados, principalmente
pela presença dos membros do Brazilian Meteor
Observation Network (Rede Brasileira de Observação de Meteoros), a Bramon.
São verdadeiros caçadores das “pedras do espaço”, que perseguem os rastros
deixados por elas, no céu ou na terra. Uma equipe seguiu o depoimento de
moradores dos municípios mais populosos da Paraíba em torno de onde a passagem
de um objeto pelo céu foi vista e ouvida no dia 20 de abril de 2015. Segundo
Renato Bandeira, que demonstrou os detalhes dessa caçada em sua apresentação, eles
conseguiram não apenas definir com bastante precisão a rota do meteoro, mas encontrar
fragmentos nos municípios de Serra da Teixeira e Olho D’água. “Nossa
metodologia já está sendo aplicada em outros casos parecidos em todo o Brasil,
como o caso do Grande Meteoro do Oeste do Paraná, e serviu para divulgar entre
a população o trabalho feito pelos astrônomos amadores. Graças a esses
resultados, houve uma grande repercussão que levou ao aumento de câmeras de
monitoramento, de uma para nove estações em toda a Paraíba”, revelou Bandeira.
As palavras do professor Irami
Amazonas, da UFPE, resumiram a qualidade dos projetos: “os trabalhos foram
feitos por astrônomos amadores, mas não deixam a desejar, não têm nada de
amador”. “Precisamos resgatar o sentido original da palavra ‘amador’, não
necessariamente daquele que não é profissional, mas daquele que ama o que faz”,
declarou o fundador da Associação Astronômica de Pernambuco, Audemário Prazeres.
Ficou definida como sede do
encontro do Eane 2018 a cidade de Bezerros/PE. Em 2017, o encontro está marcado
para acontecer em João Pessoa/PB.
Alagoas no Eane
Alagoas foi representada pelo
Centro de Estudos Astronômicos de Alagoas (Ceaal), o Clube de Astronomia de
Maceió (Clam), o Centro de Ciências e Tecnologias da Educação (Cecite) e o
Observatório Astronômico Genival Leite Lima (OAGLL). O estado teve oito
trabalhos aprovados: três pôsteres e cinco apresentações orais.
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Professor Adriano Aubert demonstrou como os astrônomos
amadores podem contribuir com a pesquisa científica |
Os pôsteres foram sobre os
resultados das pesquisas do Curso de Iniciação Científica em Astronomia
(IniCiA), promovido a cada semestre pelo OAGLL. O estudante de geografia
Genisson Panta, por exemplo, apresentou suas observações sobre as variações de
brilho da estrela ER Carinae, que começou a estudar a partir desse curso, em
2014, quando ainda estava no 2º ano do Ensino Médio. “O IniCiA me mostrou o que
é ciência, como ela opera e como eu poderia produzir trabalhos científicos”,
resumiu.
A maior representação foi do Clam,
que levou sete dos onze congressistas alagoanos. Criado em setembro de 2015, é
a primeira vez que seus membros desenvolvem trabalhos acadêmicos para
publicação. Formado por jovens entre 17 e 29 anos, o grupo levou temas
diversos, mas todos relacionados à astronomia: ensino de astronomia, a criação
de um instrumento para observação do Sol, comunicação científica e até a
influência da microgravidade no corpo humano.
Bilhões e bilhões... de colaborações
Uma das fontes de inspiração
desses “meninos” é o professor Adriano Aubert, diretor do OAGLL, que apoia o
grupo: sua palestra, última a ser apresentada, foi sobre como astrônomos
amadores podem contribuir com a ciência. “Os fenômenos celestes são muito
numerosos, então é importante que haja mais pessoas observando. A American Association of Variable Star
Observers [AAVSO, em português ‘Associação Americana de Observadores de
Estrelas Variáveis’] já tem, em seu banco de dados, mais de 30 milhões de
registros de astrônomos amadores do mundo inteiro”, comentou o professor.
Como demonstra Adriano, as
contribuições dos aficionados por astronomia podem ser muito mais que um hobby, e ajudar até a garantir a
proteção da espécie humana. “Há um grande interesse atualmente em relação aos
objetos que passam próximos à Terra. “O Sonear [sigla para ‘Observatório
Austral para Pesquisa de Asteroides Próximos à Terra’], em Minas Gerais, é
formado por astrônomos amadores e já detectou onze asteroides que têm suas
órbitas próximas à do planeta”, relatou o professor. “É muito importante que
não apenas observemos, mas também publiquemos nossas observações”, completou.
O São João está chegando. Quem
sabe, ao ouvir a tradicional cantiga do Gonzagão, mais nordestinos olhem para o
céu, veja como está lindo, e nunca mais deixem de admirá-lo... e estudá-lo.